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ATUAÇÃO E VISUALIDADE NA CIA. DE TEATRO ENGENHARIA CÊNICA

Por Luiz Renato


Em determinados processos criativos teatrais em que há intencionalmente uma relação entre atuação e visualidade como propiciadora da cena, é possível perceber como a iluminação cênica, cenário, figurino, maquiagem, entre outros elementos visuais, podem colaborar com as pesquisas do/da ator/atriz.


A Cia. de Teatro Engenharia Cênica, criada no estado do Ceará em 2005, desenvolve suas encenações a partir de uma prática pedagógica que estimula a interação da atuação com a visualidade desde a gênese da cena.


Dessa forma, os/as atores/atrizes participam da criação dos elementos visuais ao longo de todo o processo criativo e a sala de ensaio se torna o espaço pedagógico onde acontece o compartilhamento de habilidades e competências entre os partícipes envolvidos.

Essa prática desenvolvida pela Cia. de Teatro Engenharia Cênica possibilita a junção de funções na criação de uma encenação, de modo que é possível que um/uma ator/atriz possa ser também o/a iluminador/a de um espetáculo, assumindo a condução da criação e a concepção final da iluminação cênica. De que modo a visualidade está presente na criação da atuação? Como o/a ator/atriz pode ampliar seus conhecimentos sobre a cena por meio da interação com os elementos visuais do espetáculo?


Ernani Maletta, em seu livro intitulado Atuação polifônica: princípios e práticas, (2016, p. 24) propõe a noção de uma atuação multiperceptiva, exatamente aquela “que conseguiu perceber, compreender, incorporar e se apropriar dos conceitos fundamentais que definem e sustentam cada forma de expressão artística”. A atuação que assume as ações dramatúrgicas da iluminação cênica, do cenário, do figurino, maquiagem, entre outros elementos, torna-se autora de um “discurso polifônico (...) das vozes ou dos pontos de vista equipolentes de outros autores, apropriando-se deles” (MALETTA, 2016, p. 48).


Luiz Renato, fundador da Cia. de Teatro Engenharia Cênica. Encenação: O Evanescente Caminho. Foto: Souza Júnior

Segundo Eduardo Tudella, a visualidade pode ser compreendida “como o conjunto de aspectos que delineiam a qualidade visual de um espetáculo” (TUDELLA, 2017, p. 36). Quando assumida pela atuação ainda nos momentos iniciais do processo criativo, possibilita uma compreensão da cena e abre percursos para o entendimento das atmosferas por meio do corpo. As questões entre atuação e visualidade na Engenharia Cênica estão conectadas a uma compreensão de que, segundo Adolphe Appia, “o corpo, vivo e móvel, do actor (sic.) é o representante do movimento no espaço. [...] O corpo vivo é, assim, o criador dessa arte [...] É do corpo, plástico e vivo, que devemos partir para voltar” (APPIA, s/d, p. 33).


Pamela Howard reflete sobre a possibilidade de um “ator cenográfico” (2015, p. 191), que atua na sala de ensaio em diálogo com o/a cenógrafo/a para que “fiquem familiarizados com a linguagem imagística visual” (Ibidem, p. 194) do espaço da cena, participando ativamente do processo criativo da visualidade. Howard evidencia que o/a cenógrafo/a deve estabelecer diálogos com os/as atores/atrizes para saber como eles/elas imaginam o espaço cênico em que atuam, uma relação que se dá “mediante o estudo e o entendimento do corpo humano e do espaço que ele ocupa e pelo qual se desloca” (HOWARD, 2015, p. 192). Dessa forma, é possível identificar quais objetos, cores, texturas e volumes substanciam a imaginação do/da ator/atriz.


Segundo José Serroni, “Se o cenógrafo, o figurinista, o designer de luz, o sonoplasta não acompanharem também esse processo, estarão se afastando do que o ator procura. É preciso estar nos ensaios, mesmo que eles sejam repetitivos, que emperrem em longas discussões. Teatro é um processo acumulativo” (SERRONI, 2013, p. 26-27).



Cecília Maria, fundadora da Cia. de Teatro Engenharia Cênica. Encenação: #PoliFace.Edith_7x7. Foto: Wandeallyson Landim
Para a atuação, é essencial se munir de informações referentes à visualidade da cena. A pesquisa por imagens, textos, obras artísticas relacionadas à ideia, são alguns caminhos para a apropriação do imaginário que o espetáculo acessará. Essas referências são articuladas na experimentação corporal e consequentemente na elaboração de proposições cênicas.

O diálogo entre os/as artistas e os seus processos criativos na sala de ensaio propiciam a aproximação do/da ator/atriz com a visualidade e, principalmente, estimulam a interação, provocando descobertas que podem ampliar o resultado cênico. Nessa perspectiva, o/a ator/atriz assumirá no seu processo criativo a ação dramatúrgica dos elementos visuais do espetáculo, participando da criação da cena como um todo, investigando, contribuindo e problematizando a visualidade.


 

Referências

  • APPIA, A. A obra de arte viva [1921]. Tradução e notas de ensaio de Redondo Júnior. Lisboa: Editora Arcádia, 1963.

  • GUINSBURG, J. Da cena em cena: ensaios de teatro. São Paulo: Perspectiva, 2007.

  • HOWARD, Pamela. O que é cenografia? São Paulo: Edições Sesc, 2015.

  • MALETTA, Ernani. Atuação Polifônica: princípios e práticas. Belo Horizonte, MG: Editora UFMG, 2016.

  • MOURA, Luiz Renato Gomes. Os elementos visuais do espetáculo no processo criativo do ator. Belo Horizonte, 2019. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em Artes, Universidade Federal de Minas Gerais.

  • MOURA, Luiz Renato. A iluminação Cênica no Trabalho do Ator. 132 f. il. Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-graduação em Artes Cênicas – PPGARC, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2014.

  • SERRONI, J. C. Cenografia brasileira: notas de um cenógrafo. São Paulo: Edições Sesc, 2013.

  • TUDELA, Eduardo Augusto da Silva. A luz na gênese do espetáculo. Salvador – BA: EDUFBA, 2017.


 

Luiz Renato é ator, iluminador e encenador na Cia. de Teatro Engenharia Cênica do estado do Ceará. É professor do Curso de Licenciatura em Teatro da Universidade Regional do Cariri – URCA. Integrante do grupo de pesquisa LaCrirCe – Laboratório de Criação e Recepção Cênica. Doutor em Artes pelo Programa de Pós-Graduação em Artes da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais – PPGArtes/UFMG. Mestre em Artes Cênicas pelo Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – PPGARG/UFRN. Bacharel em Artes Cênicas com habilitação em Interpretação Teatral pela Universidade Federal da Bahia/UFBA.


Link dos trabalhos acadêmicos:

Link da página no instagram da Cia. Engenharia Cênica:

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