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Ator atuante no seu trabalho ou assinatura cênica do ator

Por Yuri Negreiros


Como estudante de teatro, sempre questionei o modo que se põe o ''futuro ator'' em contato com a atuação e com a reprodução da cena. Se existe diferença entre estudante de teatro porque se está ainda na escola, de um tal ''ator formado'' ? Sabendo desde sempre que o ator se forma através dos processos que é submetido. Entendo então que uma escola ambienta o estudante ao espaço do ofício, e mostra como tudo o que está estabelecido no teatro atual foi parar lá.


Acontece que formação não se discute, a não ser para intercâmbio de ideias, que por sinal dão continuidade a nossa arte. E que é necessário que a formação seja plural e diferente de um profissional para o outro, mas ela tem que ser além de base curricular, seu modo de observar e se relacionar com o mundo, criando uma perspectiva.


Mas percebi que os elementos de formação dos estudantes de teatro nas escolas convencionais estão bem distantes de suas vidas, de seu cotidiano, e de seu modo de interação com a sociedade. Talvez as escolas tenham maior interesse na adequação dos alunos com regras do mercado de trabalho, com o que está '' na moda '', e as novas tendências televisivas, não desenvolvendo uma assinatura cênica do ator. Na falta de recursos para formação do pensamento crítico, os alunos se vêem reproduzindo o passado, e constatando que um ensino obcecado por um realismo antigo não conversa com a nossa realidade.


É necessário que antes do personagem e do texto, o ator descubra que é um homem de seu tempo.

Parece bem óbvio, mas ao observar atores em formação sendo colocados em contato com textos, é bem notório que se estabelece uma relação quase que museológica com a encenação. O teatro é uma maneira de criar metáforas para que o indivíduo de seu tempo interaja e se comunique, transmitindo uma mensagem ou não, mas o que quer seja está sempre em relação a outro indivíduo de seu tempo.


Assistindo espetáculos incríveis e com linguagem bem brasileira, como "Sire Obá- A festa do Rei" do NATA ( Núcleo Afrobrasileiro de Teatro de Alagoinhas), que tem direção assinada pela baiana Onisajé, vi atores negros encenando a história de seus orixás a partir de suas vivências, seus corpos e constituindo uma assinatura própria. Por outras vezes assisti os atores mineiros do Grupo Galpão, e trabalhos dirigidos por Gabriel Villela com textos de Shakespeare e outros clássicos sem deixar de serem mineiros, sendo isso a beleza dos espetáculos


Onisajé, diretora e fundadora do NATA, estabelece o nome de atuantes para os atores de seus espetáculos. Na sua visão, os atores criam sua assinatura cênica juntamente ao diretor. A palavra mantém seu significado sem metáforas, participar de forma ativa. Quando descobri isso nos seus trabalhos achei fantástico, que alguém pudesse enxergar o trabalho do ator dessa forma, sem querer reproduzir uma estrutura de trabalho já desgastada onde o ator é marionete do diretor.


É de extrema necessidade que o ator seja atuante no real sentido da palavra e saiba o que seu corpo e sua voz física e social significam, antes de querer dar significado a qualquer coisa teatral ou teatralizada.

 

Yuri Negreiros é ator, diretor e dramaturgo. Iniciou sua carreira teatral no município de Rio das Ostras -RJ, integrando os grupos teatrais Cabalarte e Vc q Sabe. Teve passagem pelo Centro de Formação Artística de Música, Dança e Teatro de Rio das Ostras. Optou por uma formação alternativa que valorizasse os processos artístico, formando-se em atuação no Instituto Nossa Senhora do Teatro-RJ. Estudou e trabalhou com diversos diretores com Bia Lessa, Ana Teixeira ( AMOK), Francesca Della Mônica, Jean- Jacque Lemetrê ( França), Rodrigo Portella, Lydia Del Picchia (Galpão), Cia Bonobo ( Chile) , entre outros. Integra como ator pesquisador a Cia 2x1, que se dedica a pesquisa das possibilidades do teatro minimalista. Atualmente atua no monólogo Teorema das Frangas, que estreou em 2019, sob direção de Jefter Paulo. É idealizador do NEC- Núcleo de Experimentos Cênicos, onde desenvolve em Rio das Ostras a pesquisa cênica sobre as manifestações afrobrasileiras e ameríndias .Dirige com Peterson Ferreira pelo NEC o processo de montagem de Projeto Matrizes - Carukango.

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