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CORPO E IMAGEM DO CORPO: MÍDIA E EXPERIÊNCIA PERFORMATIVA EM TEMPOS DE COVID-19

Por Christina Fornaciari


Estamos no mês de agosto de 2020 em pleno inverno. Escrevo durante a pandemia da COVID-19. Faz frio em Belo Horizonte e as notícias dão conta de 115 mil vítimas fatais do novo corona-vírus no Brasil. Estou em isolamento social, confinada em casa, seguindo a orientação da OMS. Nesse contexto, analisar uma obra de arte relacionada à violência doméstica parece-me oportuno. Aumentou o número de agressões contra as mulheres nos últimos 5 meses[1], devido ao maior tempo em casa com seus pais e/ou parceiros, que são também seus principais agressores.


Sinto-me privilegiada por encontrar possibilidades de me recolher em segurança, mas me estarreço ao ver protestos pela relativização das medidas de isolamento no Brasil. Com mais de mil mortes diárias, o Presidente minimiza a catástrofe.[2] O país está sem Ministro da Saúde e o último que ocupou o cargo, Nelson Teich, chegou a admitir com naturalidade, diante das câmeras da TV, que equipes médicas deverão escolher a quem salvar.[3] A necropolítica[4] é praticada em sua face mais perversa.


Na coleção “Pandemia Crítica”[5], cujas reflexões filosóficas giram em torno da COVID-19, o filósofo e crítico de arte português José Gil (2020) escreveu acerca dos sentimentos conflitantes experimentados no contexto atual. Segundo o autor, as autoridades clamam à coletividade para “agirmos solidariamente na consciência de um pertencimento comum à comunidade. Por outro lado, somos incitados a nos isolarmos (...) e a contribuição é obedecer passivamente ao auto-isolamento” (GIL, 2020, p.3). Gil aponta como a alteridade se concretiza na solidão, pois agir pelo coletivo é, hoje em dia, permanecer sozinho. São tempos realmente contraditórios.


Um apresentador do Jornal Nacional[6] convoca telespectadores a pensar nas pessoas por trás das estatísticas, lembrando que esses algarismos remetem a homens, mulheres e crianças mortos pelo novo corona-vírus.


Acredito que quando é preciso clamar, em rede nacional, pela comoção diante da tragédia, é sinal de que, do outro lado da tela, existe uma população anestesiada.

A partir dessas reflexões iniciais, proponho analisar a performance“Ardeu 33 vezes”.


Nela, as vozes dessas vítimas anônimas, cujas mortes não geram comoção, permanecem ressoando, nos obrigando a lidar com suas memórias. Suas especificidades - tais como gênero, inserção ou marginalidade social, relações de poder - são sublinhados no fazer artístico. Presidiários, mulheres, idosos e indígenas, invisibilizados na concepção de sociedade, materializam-se na obra de arte. Ao vivo e em presença física se fazem visíveis, tangíveis e concretos. Como fantasmas encarnados, eles assustam os vivos, causam pavor e, assim, se inscrevem na memória de quem os assiste/vê. Na urgência de um contexto histórico caótico, “Ardeu 33 vezes” convocaria, nesse sentido, a um redimensionamento dos afetos.


O período de defasagem entre esta reflexão e a realização da performance“Ardeu 33 vezes”, acontecida em 2016 e 2017, permite um olhar distanciado, olhar esse que gostaríamos se alargar mais ainda, lançando luz sobre a relação histórica entre a arte e a violência.


O crítico de arte, pesquisador das mídias e filósofo alemão Boris Groys (2015; 2008) aponta que, historicamente, coube à arte representar batalhas, guerras, pestes e todo tipo de sofrimento humano. Até bem pouco tempo, reportar esses eventos, fazendo elo entre eles e a população, era a função primordial dos artistas.

A representação da glória e do sofrimento humano foi, por muito tempo, um dos tópicos prediletos de artistas. O guerreiro ia à guerra de verdade e o artista a representava, ao narrá-la ou retratá-la. (...) De certa forma, o ato heroico do passado era fútil e irrelevante sem o artista, que tinha o poder de testemunhar este feito heroico e inscrevê-lo na memória da humanidade. (GROYS, 2015, p.153)

Tanto no âmbito das narrativas literárias quanto das narrativas visuais, os artistas eram os produtores do imaginário e do acervo de memória referentes a esses acontecimentos e seus personagens. Ou seja, os grandes heróis das guerras e também os malfeitores, os mortos e os sobreviventes dependiam da arte para se darem a conhecer, para serem eternizados no tempo (GROYS, 2008).


Entretanto, essa inter-relação se modificou radicalmente, uma vez que a contemporaneidade não mais necessita dos artistas para que esses fatos sejam vistos ou conhecidos (GROYS, 2008, p. 122). Há uma série de aparatos de registro e distribuição de imagens que informam o cidadão atual. A cobertura midiática coloca à disposição do público até as imagens mais impensadas em tempo recorde. Basta lembrar que a TV mostrou ao vivo a queda da segunda torre do World Trade Center e que, algum tempo depois, pelo mesmo canal, conhecemos Bin Laden, a face do terrorista responsável pelo ato. A realidade passou a prescindir da arte para ser reportada. Ainda nas palavras de Groys:

Os meios de comunicação em massa surgiram como máquinas poderosas de produção de imagem – de longe mais extensivas e mais efetivas que o sistema de arte. Somos alimentados o tempo todo com imagens de horror, catástrofes de todo tipo em um nível de distribuição com o qual nenhum artista poderia competir. (GROYS, 2015, p.153)

Como a produção midiática é, geralmente, mais acelerada que a produção em artes, o contato com tais imagens tornou-se maior e mais intenso. No entanto, nas imagens midiáticas,a função de representar os fatos, gravando-os fortemente na memória de quem as vê, se esvaiu. Segundo o pesquisador e professor em Mídias e Violência, Magno Medeiros Silva (1997), esse fenômeno pode ser explicado pela chamada “Teoria da Dessensibilização”, segundo a qual“o ato prolongado de ver violência na mídia pode resultar em perda da sensibilidade emocional em relação à violência. A banalização da violência pode provocar indiferença social e política” (SILVA, 1997, p. 3). Silva associa essa perda de sensibilidade à exposição à violência por meios de comunicação de uso contínuo, como a TV, que está presente em grande parte dos lares brasileiros:

Neste contexto, a TV tem contribuído para fomentar o medo e insegurança entre a população porém, o pior, entretanto,é o gradual processo de insensibilização decorrente da banalização da violência. (...) os mass media facilitam “a aceitação do inaceitável”. E mais: amortecem o impacto emocional dos acontecimentos, neutralizam a crítica e os comentários e reduzem mesmo a ‘morte do afeto’ a mais um slogan ou clichê. Com efeito, a violência vem ganhando cada vez mais ares de normalidade e naturalidade, além de estar alcançando uma crescente aceitabilidade social. (SILVA, 1997, p. 4)

Essa teoria aponta para possíveis interpretações para o fato de o apresentador do Jornal Nacional, mencionado acima, vir a público conclamar por empatia. Devido a essa dessensibilização,a função do artista se transforma e ele passa a agir como um curador dentre a imensidão de imagens produzidas, decidindo quais receberão seu olhar estetizante e se tornarão arte (GROYS, 2015, p. 61). No caso do artista da performance, essa curadoria vai resultar em uma obra que solicita a presença do corpo. Assim, a arte – e em especial a performance – passa a mediar a violência reportada na mídia e sua recepção pelo espectador numa experiência mais íntima, concreta e, quem sabe, que provoque mais sensibilização. Na performance, mais que contemplação, dá-se um encontro imediato, no corpo-a-corpo. Essa experiência acaba por se inscrever na memória individual do público presente.


Nesse sentido, a obra "Ardeu 33 Vezes" propõe um lugar onde seja possível ultrapassar a anestesia, recuperando a sensibilidade que a exposição às imagens midiáticas bloqueou. Encarnada no corpo, a obra ativa alguma reação por meio da ludicidade e do jogo. Despertar a sensibilidade adormecida seria uma das características da obra de arte, como já ensinou o filósofo, professor e artista brasileiro Lanussi Pasquali: “Toda obra [artística] quer minar o desejo de fixação e de estabilidade que nos mantêm reféns, que nos paralisa e nos entorpece” (PASQUALI, 2013, p.4). Passemos, então, à descrição e análise da obra.


Imagem da performance “Ardeu 33 vezes” (2016) na Praça 7, Belo Horizonte/MG

“Ardeu 33 vezes”[7] foi concebida meses após o crime de estupro coletivo ocorrido, em maio de 2016, na Zona Oeste do Rio de Janeiro/RJ, quando 33 homens armados violentaram uma jovem de 16 anos. “Quando acordei, tinha 33 caras em cima de mim”[8] disse ela, em entrevista ao Jornal “O Globo”. Quem organizou o ato criminoso foi o próprio namorado da vítima, vingando-se de uma suposta traição por parte da jovem. Como forma de aumentar mais ainda a humilhação, os estupradores a filmaram nua, desacordada, com os órgãos sexuais dilacerados e publicaram essas imagens na internet. A vítima sofreu, assim, uma segunda violação, com sua exposição em diversos meios de comunicação.


Em um dos vídeos, um homem ironizou o próprio crime, postando a legenda “Estado do Rio de Janeiro inaugura novo túnel para passagem do trem bala”[9], e apontou para o corpo ensanguentado da jovem. Em outro vídeo, lê-se “Amassaram a mina, intendeu (sic) ou não intendeu (sic)? KKK.”[10] A imagem circulou tanto que a própria família da jovem somente soube do estupro ao receber o vídeo pelo WhatsApp.


Assim, a performance “Ardeu 33 vezes[11]” surgiu com intenção de dar um corpo àquela imagem que circulava, a fim de materializar e humanizar aquela menina. Era uma tentativa de gerar identificação com a vítima e, quem sabe, trazer à tona a pauta da violência doméstica[12].


Sempre voltada para o corpo, a performance se dá por meio da ação de mastigar e comer 33 pimentas bastante ardidas, contando em voz alta cada pimenta ingerida. A performer encontra-se sentada num banquinho no meio da praça com as pernas fechadas. Aos poucos, uma pequena multidão forma um semicírculo em torno da ação.


Uma. Duas. Três. Quatro. À medida que as pimentas são comidas, a performer vai lentamente abrindo as pernas. Cinco. Seis. Sete. A performer começa a dizer frases e pequenos trechos de matérias jornalísticas sobre o caso. Oito. Nove. Dez. Onze. As pernas da performer estão semi-abertas. Doze. Treze. Quatorze. Quinze. O ardor começa a provocar vômito,salivação e lacrimejar excessivos. Como diria Pasquali: “Produzir uma obra de arte ou fazer um encontro com uma, são maneiras muito reais de viver.” (PASQUALI, 2013, p. 4)


Dezesseis. Dezessete. Dezoito. Movimentos involuntários perpassam o corpo da performer. Dezenove. Vinte. Vinte e um. Falta de ar, engasgos e tontura. Vinte e dois. Vinte e três. Vinte e quatro. As pernas estão no limite da abertura, a fala sai embargada.


Vinte e cinco. Vinte e seis. Alguém da plateia murmura: “Acho que é sobre o estrupo (sic) daquela menina lá no Rio”. Vinte e sete. Vinte e oito. Os espectadores vão somando os fatos e, de repente, era consenso: trata-se do caso da jovem estuprada por 33 homens. Espanto. Choque.


Como num jogo, os presentes conversam até entenderem a regra: para cada pimenta, um estuprador. Logo, a performer deveria ingerir 33 pimentas. Esse entendimento permite encontros imprevisíveis. Vinte e nove. Uma voz de homem vinda do público diz: “me dá uma que eu vou comer pra você, não vou deixar você sofrer sozinha”. Trinta. Outro integrante da plateia também decide tomar o lugar da artista. Trinta e um. Trinta e dois. Trinta e três. A artista é poupada de arder.

A performance foi realizada em duas ocasiões, ambas no espaço urbano de Belo Horizonte/MG. Nas duas apresentações, o público participou ativamente do jogo, decidindo me salvar e impedindo que eu chegasse até o número Trinta e Três. A decisão de interromper minha ação marca a transformação do público. Ali se produz um devir, um rompimento da anestesia, como se a identificação imediata na fissura da obra os tornasse, de repente, capazes de interromper o próprio estupro coletivo, interromper a violência ou ao menos a sua naturalização. Poderíamos evocar as palavras de Lanussi Pasquali:

Cada vez que experimentamos uma obra que nos afeta, sentimos crescer uma força errática, dançante, que nos maravilha, plena de alegria e de resistência: a arte é sim uma atividade diferenciada do resto da cultura, que ultrapassa o senso comum. Uma vitória sobre a morte. (PASQUALI, 2013, p. 10).

Há algo de xamânico na obra analisada, sugerindo que pode haver uma dimensão espiritual para essa performance, onde nos tornamos um outro, onde pode haver alteridade encarnada no corpo. Parece-me retornar o sentimento de purga, de cura ritualística daquilo que traz desconforto, seja em termos individuais, quanto coletivos.


Num movimento contraditório, é como se quebrar a anestesia e trazer a possibilidade de sentir dor pudessem curar. Mesmo sem dizê-lo explicitamente, parece oferecer efeito curativo ao público, à própria artista envolvida, à sociedade.


Em tempos de pandemia mundial, talvez a palavra de ordem seja mesmo cura. Aquilo que mais se almeja, em tempos de corona-vírus, é cura. Cura para a COVID-19, cura para quem perde seu ente querido, cura para a dessensibilização, cura para a ordem mundial que monetiza tudo e todos, cura para as necropolíticas. Espero que, ao ser publicado, este texto tenha curado a si próprio por meio da arte, e que a obra aqui analisada possa, de alguma forma, ser cura também para quem o lê.


 

[1]Desde que as medidas de isolamento social entraram em vigor, um o número de denúncias de violência doméstica aumentou em todo o mundo - só no Estado do RJ, houve aumento de cerca de 50%. Reportagem do dia https://oglobo.globo.com/sociedade/coronavirus-servico/violencia-domestica-dispara-na-quarentena-como-reconhecer-proteger-denunciar-24405355 acessada em 20/05/2020. [2] Reportagem do dia 20/04/2020 https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2020/05/19/sem-ministro-da-saude-ou-presidente-brasil-registra-1179-mortes-em-24h.htm acessado em 20/05/2020. [3]Reportagem do dia 17/04/2020 https://noticias.uol.com.br/colunas/reinaldo-azevedo/2020/04/17/teich-escolheria-mandar-velhos-morrer-em-casa-para-reservar-uti-a-jovens.htm acessada em 20/05/2020. [4]Conceito cunhado pelo filósofo Achile Mbembe (2018), que pressupõe que a expressão máxima da soberania reside, em grande medida, no poder e na capacidade de ditar quem pode viver e quem deve morrer. “Por isso, matar ou deixar viver constituem os limites da soberania, seus atributos fundamentais”. MBEMBE, 2018, p. 4. [5] Publicação on-line lançada pela N1 edições, disponível em https://n-1edicoes.org/001 acessada em 20/05/2020. [6] Reportagem do dia 07/05/2020 https://www.terra.com.br/diversao/gente/purepeople/bonner-faz-alerta-no-jn-sobre-gravidade-da-covid-19,bfcb6d848569363927cb65a175dbeba6kodgpdef.html [7]Link para vídeo da performance https://www.youtube.com/watch?v=l-AL_l_rNhM [8]http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2016/05/beltrame-classifica-como-barbarie-caso-de-estupro-coletivo-no-rio.html notícia publicada no dia 27/05/2016, acessada em 15/05/2020. [9]http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2016/05/beltrame-classifica-como-barbarie-caso-de-estupro-coletivo-no-rio.html Notícia veiculada no dia 27/05/2016, acessada em 15 de maio de 2020. [10]http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2016/05/vitima-de-estupro-coletivo-no-rio-conta-que-acordou-dopada-e-nua.html Notícia veiculada no dia 26/05/2015, acessada em 15 de maio de 2020. [11] Trecho da performance em https://www.youtube.com/watch?v=l-AL_l_rNhM [12] O Instituto Maria da Penha define violência doméstica como um padrão de comportamento que envolve violência física ou psicológica por parte de uma pessoa contra outra, num contexto doméstico, como no caso de um casamento ou união de fato, ou contra crianças ou idosos Esse abuso pode acontecer por meio de ações ou de omissões. A maioria das vítimas desse crime são mulheres. http://www.institutomariadapenha.org.br/violencia-domestica/o-que-e-violencia-domestica.html acessado em 19/05/2020.

 

Referências Bibliográficas:

  • GIL, José. Medo. In Coleção Pandemia. Rio de Janeiro, 2020. Acessada em 20/05/2020, em https://n-1edicoes.org/001

  • GROYS, Boris. Art Power. Cambridge: MIT Press, 2008.

  • ____________. Arte e Poder. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2015.

  • MBEMBE, Achille. Necropolítica. Trad. Renata Santini. Rio de Janeiro: N1 Edições, 2018. PASQUALI, Lanussi. Arte como jogo. Salvador: Blade, 2013.

  • SILVA, Magno Medeiros. Teorias da Violência, Mídia e Direitos Humanos In Revista DHNET Redes de Direitos Humanos. Natal, 1997. Acessada em 20/05/2020, em http://www.dhnet.org.br/dados/cursos/dh/br/go/goias/teorias_da_violencia_midia_e_dh.html

Referências Jornalísticas:


 

Christina Fornaciari (1977) é artista, pesquisadora e professora em Artes do Corpo no Departamento de Artes e Humanidades da Universidade Federal de Viçosa. Investiga o fazer artístico relacionando artes e Direitos Humanos tendo o corpo como plataforma, na interface entre a performance, o vídeo e a fotoperformance. É Doutora em Artes Cênicas pela UFBA e Mestre em Performance pela Queen Mary University of London e em Práticas e Teorias Teatrais pela USP. Formada em Direito e pelo Teatro Universitário da UFMG Apresentou suas obras nacional e internacionalmente em locais como Museu de Arte da Pampulha (BH/Brasil), Whitechapel Gallery (Londres/UK) e Beijing Art & Design Week (Pequim/China). Autora dos livros "Funk da Gema: de apropriação a invenção por uma estética popular brasileira" e "Corpo em Contexto" voltado para análise da produção brasileira em artes perfor vativas em contextos de minorias étnico-sociais. 


Contato: christinafornaciari@gmailcom 

Redes sociais: Insta: @christinafornaciari_art e @christina_fornaciari | Face: christina fornaciari

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