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ésTUdo circo entrevista: Grupo Teatro Kabana

Atualizado: 26 de abr. de 2022

Por Ludy Lins e Wendell Guilherme


Para comemorar o dia do circo, trazemos hoje o primeiro episódio do PodésTUdo circence e na ocasião, convidamos o Grupo Teatro Kabana, que nos contou um pouco de sua trajetória, todas as práticas circenses feitas por eles e a proximidade com o Teatro Universitário.

Vem com a gente e leia a entrevista com Mauro, Nélida e Lira Xavier



Elaisa: Gente muito obrigado por essa apresentação, essa roda virtual, e para dar início e continuidade ao nosso bate-papo, a gente gostaria de conhecer um pouco de vocês em relação a construção histórica do Teatro Kabana. Então vou perguntar: o que é o Teatro Kabana? Assim a gente pensa junto com vocês sobre essa trajetória do Grupo, desse galpão, das pessoas que estão aqui, dos trabalhos realizados e envolvidos ali. Então convido vocês a estarem falando e compartilhando com a gente essa história.


Mauro: Talvez como nós estamos dentro do universo do circo, a gente fale um pouco como que o circo passa em nossa vida considerando que a gente não é oriundo de família circense. Eu fiz curso de teatro na escola de teatro, estudei, além de muitas coisas geniais, o palhaço e fui me tornando um palhaço profissional durante toda a vida. Através da palhaçaria fui me aproximando também das outras técnicas circenses e então a gente começou a ter que aprender tudo que tinha no circo. Percebi que o circo era uma extensão do meu trabalho de palhaço e isso foi se construindo durante essa trajetória. Considerando que a gente estava em Minas Gerais, que ainda a gente não tinha uma escola de circo, a gente teve que ser um pouco autodidata, se formando e bebendo muito do que a gente tinha em Minas que são circos de periferia, os pequenos circos que ainda rodam a região metropolitana de Belo Horizonte, e nós acabamos buscando boas parcerias, bebendo e dominando um pouco das técnicas essenciais do circo.


Nélida: Lembrando que um pouco depois disso que você está falando, foi muito importante o Festival de Inverno, nesse caso da formação circense sua principalmente.


Mauro: O Festival de Inverno trouxe em algum momento, em 1982 (Nélida confirma), uma oficina de teatro de rua com uns alemães no Teatro Livre de Monique, em Diamantina, e eles trouxeram, além da questão da técnica do teatro de rua, um casamento muito bem construído com o circo, tendo o circo como mais um elemento do teatro de rua. Como pude participar dessa oficina nessa época, isso acabou alimentando muito nossos conhecimentos, principalmente no direcionamento para nossa técnica, que acabou se construindo de uma técnica de teatro de rua, de circo, de teatro de palco, teatro de boneco, de música e o circo entrou com muita força depois dessas oficinas que tivemos oportunidade de fazer com esses alemães.


Nélida: A partir dessa oficina do Mauro e de outras circos que fomos pesquisar e conhecer, ali já éramos um grupo de pessoas interessadas na arte circense, no teatro, a gente acabou se juntando num certo momento para dar aula de circo para crianças e isso já foi no Festival de Inverno em Diamantina, também em 1985 ou 84, que não lembro exatamente.


Mauro: Mas essa é só uma primeira introdução, porque basicamente a gente vem do autodidatismo e das fontes possíveis de Minas naquela época, que eram os pequenos circos. A gente dava uma perambulada no picadeiro com Zé Wilson, dava uma "xerecada" também no Rio, na Escola Nacional de Circo, mas enfim, a formação mesmo acabou sendo nas práticas e muito em cima da nossa temática de dominar as técnicas para o nosso cotidiano de palhaço que a gente utilizou basicamente para ganhar a vida.


Nélida: Isso é o que permeia o grupo desde sempre, esse circo que sempre esteja presente, não exatamente só as técnicas circenses. O circo sempre foi a nossa preparação, mesmo que a técnica não entrasse em cena, o circo era a preparação corporal dos atores e o Kabana entrou muito nessa linha e segue por ela até aqui.


Mauro: O circo acabou também sendo uma forma quase que de interpretação. Na medida agente buscava com sentimentos, sensações, algumas situações de cena que a gente precisava de desenvolver com os atores, e agente acabava usando o circo para que o ator conseguisse externar aquele sentimento que a gente queria trazer para cena e depois transformava no sentimento da cena. Isso era uma construção muito presente na nossa vida de teatro e também na minha vida como diretor.


Elaisa: E você lira, como o Teatro Kabana atravessa suas vivências como professora, como artista, enquanto o produtora de conhecimento? compartilha um pouco com a gente.


Lira: Eu tinha 4 anos de idade no primeiro Festival Universitário, e como filha dos dois, desde aquela época até hoje eu ia junto. Afinal, iriam deixar o filho com quem? A gente acaba que participava junto do festival e ali entrava nas oficinas. Então desde os quatro anos eu fiz parte desse ambiente circense e teatral. Participei de várias oficinas de circo no Festival de Inverno, esse festival super concorrido, com lista de espera, né pai?, porque as pessoas queriam participar daquelas oficinas a qualquer custo. Na verdade foi um prazer estar ali desde nova, aprendendo não só circo, mas o trabalho em equipe, o lanche, o bandejão... Eram férias maravilhosas! E para o escrever junto com o Manoel Barreiro o livro que saiu no final do ano passado, a gente escutou relatos de ex-alunos, de professores, os monitores, em como que as oficinas impactaram a vida de todo mundo. Então foi o caminho muito bacana.


Elaisa: Agora quero saber de vocês sobre esse lugar do autodidata, da construção, desse desejo de melhorar a cada dia suas habilidades, dessa performance enquanto diretor, enquanto artista, enquanto pesquisador. Também a gente fica pensando se teve o momento de virada da chave para essa urgência de trabalhar com o circo, de se pensar que esse trabalho era importante, relevante. Quando que veio isso para vocês?


Mauro: Acho até legal essa pergunta porque ela está colocado do ponto de vista acadêmico e para nós a questão é colocada do ponto de vista da vivência dos seres, dois jovens que estavam procurando um caminho. Esse start ele veio na medida que eu estava saindo da escola de teatro e queria encontrar um caminho, aí o circo veio me formar um palhaço e isso se tornou uma profissão, apesar de eu ter me formado em outras coisas. Ao longo da vida inteira a gente exerceu essa profissão no sentido de ganhar pão mesmo, de sobrevivência nossa. Então esse start aconteceu na medida de jovens procuravam caminho.


Eh Boi - 2006 Bogotá - CO - Acervo Pessoal Grupo Teatro Kabana

Nélida: Talvez para mim tenha sido mais nítido esse momento do start, para a Lira por volta dos 15 anos e eu um pouco mais velha, vinte e poucos, tive que fazer uma escolha. Eu era professora de inglês e português, formada em letras, dava aula em escola mas já trabalhando com circo, com palhaço, e chegou um momento em que eu tive que fazer a decisão: não dava mais para continuar sendo professora de línguas e de circo ao mesmo tempo, tendo que viajar e fazer outras coisas. Então nesse momento para mim, talvez ali aos vinte e poucos anos, eu tenha tomado essa decisão de que seria o teatro e não a vida de professora, a vida acadêmica, então então diferente de você eu tive esse momento.


Mauro: Eu acho que sempre houve a junção das duas coisas: do desejo de você ter uma trajetória ligada com a arte, especialmente ao teatro que tem coisas extremamente potentes, e também esse outro caminho que se abriu para nós que é o caminho profissional. A gente sempre transitou em áreas muito diversificadas no mundo das artes: a gente dirige espetáculos, a gente iluminava, a gente dava oficina de circo, oficina de teatro, oficina de teatro de rua, oficina de palhaço, então a gente com esse leque de coisas foi nos permitido avançar pela cultura e consolidar uma carreira profissional.


Nélida: Eu tinha pensado que tinha abandonado a minha vida acadêmica, com letras, o português o inglês, mas chega um momento que isso foi fundamental na nossa vida. Foi muito importante a minha formação em línguas, assim como foi muito importante a formação do Mauro em sociologia e história, tudo é uma mistura e a gente vai com o tempo vê que tudo aquilo vai se misturando, as coisas vão se complementando, e não se excluindo como você mesmo disse. As coisas vão ficando mais potentes a medida que você entende que aquela sua formação lá atrás tá sendo super importante agora. Cada coisa que a gente passa ela vai agregando, todas as formações, tudo que a gente consegue arrebanhar ao longo do tempo é muito importante para trajetória da gente, de se fazer confiante no que a gente vai fazer. Essa trajetória que a gente tinha, nos levou a a ter coragem de comprar um dia esse galpão que a gente tem já há 25 anos, e que vivemos aqui e trabalhamos aqui, que é aqui no Mazagão. Talvez hoje seja difícil de entender o que que era isso aqui quando a gente chegou, para a gente ter essa coragem, a gente tinha que estar fortalecido com a base que a gente tinha, para estar aqui de pé e continuar trabalhando.


Mauro: E nesse caso o circo é muito importante.


Nélida: A base é o circo.


Mauro: O circo fortalece o indivíduo, o espírito, permite a superação, então circo ele cria esses seres corajosos, aliás a coragem é um elemento fundamental do circo.


Maria Clara: Acho importantíssimo esse caminho que vocês estão trazendo, da vida de artistas fora da academia, porque aqui a gente tem esse projeto, que é um projeto de dentro da universidade, então ele tem esse viés acadêmico. Por que pesquisa para gente dentro da universidade que tem um formato específico, mais quadrado? A gente sendo artista dentro da academia quer propor outras formas de se pesquisar, mas porque não reconhecer essas formas como pesquisa? A gente da arte tá querendo dizer para universidade "Olha, o formato não precisa ser só este, todos nós que somos artistas fazemos pesquisa". Por que que o circo ainda não existe como área de conhecimento dentro na Universidade? Por que que não existe o quadradinho do circo para preencher quando vou fazer pesquisa? E aí eu posso dizer que o meu lugar, que ocupo hoje, foi a partir da Universidade. Se existe eu, Maria Clara, que conheceu o circo não tendo nascido numa família circense e tive a oportunidade de vivenciar e tornar artista e hoje em dia ser professora inclusive de circo dentro da própria UFMG, quem me apresentou o circo foi a UFMG através de vocês, lindos e maravilhosos.


Mauro: Eu vou tentar responder Maria um pouco dessas questões que você levantou. Acho que nós somos uma geração de quando surgiu no mundo um termo, que eu vou falar só para termos referencia porque eu não gosto desse termo, que é o novo circo, que é um circo que agrega, além do habilidade física, agrega muito mais o luz, mais música, muito mais o teatro. É aqui que eu não concordo com a nomenclatura porque quando se pensa no novo, se você também pensa que existe o velho circo, e isso é até uma questão muito pejorativa. O circo na realidade, ele é uma atividade que foi construída sempre da renovação. O circo sempre trouxe para debaixo da lona, muitas vezes até fora da lona, quando o circo saiu lona, sempre as grandes novidades estavam surgindo no mundo, desde da cultura africana que vinham os elefantes até tudo, tudo, o circo sempre agregou as novidades e vendeu muito bem essa sua capacidade de renovação. Eu acho que nos últimos 30, 40 anos, sei lá quando, as pesquisadoras conseguem ser mais específicas, a gente vive um momento em que o circo deu um salto de linguagens onde ele saiu de um espetáculo que era basicamente formado nas habilidades, ou então pouco antes, do teatro pavilhão que foi um outro momento do circo em que também se reinventou, para esse circo de hoje, que podemos citar Cirque du Solei, que talvez seja a maior expressão que se tem dessa coisa contemporânea do circo. Acho que a gente viveu meio que nessa época dessa transformação, a gente viveu um pouco essa época onde o circo começou a se relacionar muito mais com as outras áreas. E talvez para Minas Gerais a UFMG com o Festival de inverno, tenha um papel fundamental porque ela entendeu no começo dos anos 80, que o Festival de inverno era um acontecimento de extrema importância para renovação artística, para pesquisa para o questionamento da realidade, e ela resolve investir então no circo como uma das linguagens, de forma sistemática para o Festival de Inverno . Agente entrou ficou 12 anos na universidade com a professora Mirian Tavares, que foi professora no TU junto com Marcelo Bones, posteriormente com Léo Ladeira, a gente propôs para o Festival de Inverno o desenvolvimento dessas atividades, que aliás no começo chamava oficina de circo, teatro e dança, a ideia já era misturar as linguagens. Então a UFMG comprou essa ideia e colocou dentro dos festivais. Foi muito bacana, isso formou muita gente, muito jovem, e eu acho que Lira través dessa desse resgate do livro que ela fez, conseguiu fazer o registro disso. De alguma forma o grupo Kabana teve uma relação grande com TU, a Miriam era professora do TU por muitos anos, e tinha um porão que era nossa cede onde a gente guardava a nossa vida artística, no porão do TU; eles nos cediam aquele porão e a gente em troca dava oficina de extensão para os alunos do Teatro Universitário, também abertas ao público. A UFMG foi fundamental, tanto para Minas Gerais na consolidação dessa linguagem como ela está hoje, quanto para nosso grupo Kabana, pois era nosso espaço de experimentação, a gente a cada ano tinha que trazer mais novidade, tinha que trazer mais coisas, experimentar uma coisa nova, novas habilidades, novos espetáculos, então era muito importante esse grande desafio. A gente reconhece a UFMG como grande fomentador do circo em Minas Gerais, desta forma, de circo contemporâneo, e a gente é fruto de tudo isso, certo Maria? Você confirma isso porque você é uma grande participante desse processo.


Maria Clara: Certo, isso que me move também a dar continuidade a esses projetos que não é só um, o ésTUdo circo veio lá do grupo de Estudos Circenses, devido a pandemia vem desencadeando um monte de coisas. Tem gente fazendo agora o mapeamento das atividades circenses da UFMG, que aí Liroca, os meus outros bolsistas devem te procurar para também entender esse mapeamento que você já fez aí de 85 à 95, que eu disse a ales: “vocês têm uma pérola que a Lira já garimpou para nós”. Eu sou assim, a minha história de eu estar hoje nesse lugar, que eu estou orientando os bolsistas, tem tudo a ver com aquele primeiro dia que eu fui ali, eu estava no CP, eu era bolsista da educação física, no Festival de inverno eu participava da oficina de educação física, e lá no CP tinha um cabo de aço escrito não suba e não tinha ninguém perto eu subi (risos). Ali conheci vocês e a partir dali foi muito interessante, porque a primeira vez que eu balancei num trapézio eu falei “eu não vou largar isso nunca mais na minha vida!” Eu lembro até hoje, eu dava aula no ginástico e tinha já minha motinha, e o Mauro dava oficina. Eu chegava nos últimos 15 minutos da oficina pra balançar, eu saia do ginástico com a minha motinha, a minha aula era até 11:15 e a oficina acabava às 11:30, e e eu em 5 minutos conseguia descer o tobogã dá contorno e conseguia chegar lá para fazer o trapézio, e era no TU, foi quando eu conheci o TU. Depois disso que eu vi que ali era uma escola de teatro, onde o Léo Ladeira me apresentou o teatro dessa forma, aí decidi entrar nessa escola de teatro. Se eu vivenciei isso que vocês estão falando, o porão, os materiais, a história, vocês com as oficinas, que eu lembro tudo, e o quanto isso para mim é importante. Eu que vim da educação física, né Lira, nunca fui ginasta, mas eu era apaixonada com a ginástica olímpica. As acrobacias da ginastica olímpica para mim eram acrobacias, tanto que eu tive a oportunidade de ser monitora de uma aula acrobacia. Eu naquela rigidez tecnicista da educação física e o Mauro era aquele louco, fazendo aqueles meninos pulando de um lado para o outro, e o que eu aprendi com vocês que era questão do artístico mesmo, que era o que é possível fazer e é sobre isso o que é para fazer. Na oficina de Inverno os meninos ficavam tanto tempo na oficina, que tinha febre de tanto fazer atividade física, era febre de cansaço! Interessante que a Delisiê que é professora na Escola Nacional de Circo, que foi minha outra mestra, porque Mauro e a Nélida são meus mestres iniciáticos, e a Delisiê, que falava, salve engane, curbartur, que era dor de curvatura. O circo tem isso, como ele viaja muito ele sempre traz vários vocabulários, e ela falava que eles tinham dor curvatura, que era febre de tanto trabalhar; e na hora que ela me falou eu percebi que eram os meninos na oficina do Festival de inverno que faziam algazarra de manhã e de tarde, e as mães e os pais adoravam, que à noite mal jantavam, já dormiam.


Nélida: Era isso mesmo. A oficina de circo era muito intensa e eram muitos dias, então eles queriam dar tudo da vida aquele tempo, naquele espaço que tinha. Muito legal!


Mauro: A gente falou muito no início a importância da UFMG, dos Festivais de Inverno, e eu gostaria de falar um pouquinho da Estação Teatro Kabana, que é o local que hoje estamos localizados. Para quem não conhece aqui o nosso espaço, a gente saiu do tempo para mudar para cá. Então a gente procurou um espaço, um galpão, que pudesse abrigar de uma forma muito mais bem organizada a nossa atividade de teatro e que a gente pudesse avançar muito na questão do circo. O nosso espaço, do ponto de vista do circo, ele é um espaço que permite coisas muito bacanas, nós temos 9 metros de pé direito, então isso permite que a gente deixe montado aqui um petit volante, trapézios, tecidos, corda marinha, uma estrutura muito grande para perna de pau, monociclos, etc. O Marzagão foi a continuidade da nossa pesquisa, só que de uma forma muito mais organizado. Do ponto de vista espacial está mudado, até hoje então a gente continua ainda nesse processo. A gente pôde ter ao longo desses anos experiências muito significativas com circo, que inclusive Maria foi participante dessa experiência, de logo no início do processo de quando a gente tinha comprado do Marzagão, o espaço muito pouco estruturado, Maria vem com grupo da Escola Nacional de Circo para fazer uma residência. Então Maria vem como a turma grande passar vários dias morando em barracas, no galpão e em barracas, para desenvolver o trabalho. Para gente é muito bacana, isso que a gente queria: um espaço de excelência, um espaço de pesquisa, de aprofundamento, de mergulho das artes e essa experiência foi muito legal com os alunos da Escola Nacional de Circo, para além tivemos outras interferências muito marcantes, uma delas foi uma formatura que eu pude dirigir, Nélida escreveu o texto dos alunos do palácio das artes, e a gente também trabalha muito com o tema da palhaçaria, com o tema do circo e esses alunos também mudaram aqui pro Mazagão, fizeram um internato aqui, uma vivência muito profunda e o espetáculo final também aconteceu aqui no Mazagão, trazendo muita coisa do circo pavilhão, histórias legais, palhaço, muita coisa de circo. Talvez um outro momento que a gente pode exercitar muito circo foram alguns projetos que vieram alguns anos depois, numa parceria com a Petrobras, a gente pode desenvolver aqui no Mazagão grupos regionais com o trabalho de teatro e circo, onde tivemos várias turmas que acabavam resultando em espetáculos geniais utilizando essa estrutura que o Mazagão nos propicia, que é essa grande caixa cênica com 9 metros de pé direito, com lugar e suporte para coisas de altura.


Nélida: Só uma coisa para eu falar, que o tempo todo quando ele fala “aqui no Mazagão”, o Marzagão é um bairro, é a vila Mazagão e ele está se referindo na verdade ao espaço do galpão que é a Estação Kabana. E quando a gente fala Marzagão a gente está se referindo ao bairro inteiro.


Duelo 2005 - Montes Claros - Acervo Pessoal Grupo Teatro Kabana

Mauro: A vila na verdade, porque que tem só 50 moradores.


Nélida: Uma vila enorme, mas agora é o lugar que a gente adora, inclusive a gente mora aqui. Acho que com a vinda nossa para cá a gente conseguiu se organizar, nosso material, a nossa vida artística, as novas montagens, ter espaço para guardar tudo, sala separada, sala de ensaio, oficina de confecção, marcenaria, serralheria, tudo isso que a nossa chegada aqui nos proporcionou . Mais do que isso, eu acho que o nossa história, de a nossa trajetória até pessoal, de a gente ter enxergado aqui nessa vila um lugar que a gente poderia também entrar numa outra luta também a luta do patrimônio histórico, que tava sendo demolido e a gente resolveu encarar isso de uma forma séria e também como uma nova vertente para novos trabalhos, então a luta pela preservação da memória do patrimônio histórico ambiental daqui dessa região foi realmente o braço para o nosso trabalho e ainda é.


Mauro: Que acabou inclusive em 2004 resultando no tombamento da vila como um todo pelo IEFA. Foi um processo muito difícil mas que hoje a gente vive num sítio histórico que tem uma proteção desse órgão estadual.


Nélida: Apesar de continuar bastante abandonado.


Mauro: Era só para a gente fazer essa colocação de como Mazagão, nosso espaço, foi um novo momento da nossa atividade artística, especialmente porque ele abrigou de uma forma muito legal o circo.


Elaisa: Pelo que vocês estão compartilhando, sinto que o Teatro Kabana tem muito desse lugar de se acompanhar a aprendizagem de quem está ali, de quem atravessa, e aí criando uma ponte com a outra questão, que eu também gostaria de te trazer aqui para vocês, sobre os processos de aprendizagem, de preparação para atores e não atores, circenses e não circenses, eu fico pensando se vocês consideram também o galpão como espaço que também trabalha com projetos sociais. Como é que é isso para vocês?


Mauro: A gente já realizou aqui no nosso espaço alguns programas que tem a ver com formação. A gente está localizado na região periférica de BH, na verdade em Sabará, então a gente naturalmente agrega um público que é menos favorecido, que tem mais carência.


Nélida: É um público que não tem muito acesso. Então é a gente não é um projeto social, a gente nunca quis, nunca formalizou isso mas a gente sempre teve uma ação social, ao longo desses anos todos, viemos fazendo apresentações gratuitas para a população em geral e para as escolas. Todo ano a gente recebe aqui no nossos espaço muitas escolas, muitos estudantes que vem para assistir os nossos espetáculos, então a gente faz assim, por exemplo, a semana inteira de espetáculos para escola. A gente dá formação para esses jovens aqui também, então a gente claro tem esse braço, que eu tô falando que é o braço social, sem ser projeto social.


Mauro: A gente não é um projeto social no sentido clássico, a gente acha que é um projeto cultural, e um projeto cultural acontecendo onde estamos, ele é um projeto social porque é impossível não ser, então a gente acha até que é um pouco mais pela questão do patrimônio, da preservação desse lugar histórico, da vila, isso amplia um pouco mais para uma coisa que é fundamental para um grupo artístico que é a relação que ele tem com o lado de fora do muro dele. Então a gente tem uma relação, uma responsabilidade muito grande com a comunidade que a gente está inserido, que nos acolhe com muito carinho, que a gente também tenta retornar para comunidade o máximo possível, e a gente pode oferecer basicamente é essa bagagem cultural que a gente traz aqui para vila, então isso é uma relação natural para nós, mas assim sem formalismo, sem ser ONG, que a gente não é uma ONG, então a gente tem essa relação de uma forma tranquila e natural, inclusive bem tranquila em relação a comunidade aqui do Mazagão (onde a gente mora hoje, porque a gente não morou aqui a vida inteira a gente mora aqui há 12 anos) e o nosso entorno, porque nós estamos aqui na região do General Carneiro, das nações unidas, das vilas unidas, que nós temos uma população muito grande no entorno do nosso espaço, então a gente tem lidado com essa questão da ação social mas sem pensar no projeto social.


Mauro: A gente tem a percepção do que chega para nós é que a região defende que aqui é um bem cultural da região, então assim “você já foi lá no Kabana? O pessoal do Mazagão já foi lá assistir o espetáculo que é legal para caramba”, então assim a região toda tem a percepção de que aqui é um bem que acrescenta do ponto de vista da Cultura, do peso cultural da região e a gente não faz isso com esse objetivo. Isso é uma coisa que acontece naturalmente pela ação que a gente tem feito durante esses anos.


Lira: E já empregou muita gente da região, várias pessoas da vila de já trabalharam na Estação.


Nélida: Inclusive, a Maria Clara já deu algumas aulas para jovens moradores daqui, aulas de trapézio e de outras cênicas também, porque durante bastante tempo eles trabalharam como monitores nossos e em vários trabalhos fora daqui. A gente levava o pessoal daqui que tava aprendendo para trabalhar com a gente. É essa história que a gente acha que é uma coisa natural, a gente não precisa ser um projeto social para que isso aconteça, então essa ação que faz as coisas se aceitarem de uma maneira fluida.


Maria Clara: Antes de terminar, eu queria que todos vocês dissessem juntos o nome da oficina, o nome completo eu quero ver:


Nélida, Mauro e Lira: Oficina de Circo, Teatro e Dança: Esses incríveis arteiros espalhafatosos malucados e desbiolados aprendizes do Circo!


Nélida: Não era esse o nome, inicialmente se chamava apenas Oficina de circo, teatro e dança, aí depois de alguns anos...


Mauro: A gente quis mudar o nome, mas a gente queria um nome que não servisse para nada! Por isso que as pessoas continuam chamando de Oficina, porque falar esse nome todo era um desafio, e assim ficou sendo somente uma Oficina de Circo.



Para conhecer mais do Grupo Teatro Kabana, ouça o podcast completo!


 

O Grupo Teatro Kabana traz como fundadores o casal Mauro Xavier e Nélida Prado, que escolheram a arte como labor e sustento da vida.

O Grupo traz a forte presença do circo em seu fazer e teve trocas de saberes bem íntimas com o Teatro Universitário. Nessa relação eles marcaram presença como oficineiros durante anos na Oficina de Circo, Teatro e Dança, do Festival de inverno da UFMG.

O Grupo possui uma sede que tem um papel fundamental em sua trajetória, a Estação Teatro Kabana, que é um grande galpão com estrutura suficiente para acolher as necessidades do circo e do teatro, localizado na Vila Marzagão, em Sabará -MG.




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