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TEXTO-ENTREVISTA COM MYRIAM TAVARES - PARTE I

Atualizado: 31 de ago. de 2021

(Des) equilibrar-se na corda-bamba para alçar voos: malabarismos que atravessam memórias e percursos artísticos


Alexander Teixeira

Diego Balduino Vieira

Ludy Lins



O tempo, ao compor destinos e musicalizar todos os ritmos, tem o poder de atravessar fronteiras e barreiras. Por vezes, ele nos assusta. Por outras, nos surpreende. Quando menos esperamos, o tempo cruza caminhos de pessoas que, por meio de um entrelace, formam juntas outras possibilidades de percurso. De nó em nó, o caminho é feito e desfeito, sempre a partir de um elemento que lhe é inerente: o encontro. Esta é a grande palavra-chave deste texto, cujo cenário só poderá ser dimensionado (e experimentado) se levarmos em consideração outro elemento: as artes circenses. Foi por meio do circo e da investigação das práticas circenses que muitos encontros foram oportunizados, o que mudou totalmente a configuração das artes teatrais e do próprio modo de se fazer teatro. Inserido nessa dinâmica, o Teatro Universitário da UFMG também teve sua história reconfigurada pelo circo. Afinal, és TUdo circo! Desse modo, não poderíamos deixar de convidar a artista Myriam Tavares, professora aposentada do TU, para um bate-papo sobre circo, teatro, valorização da cultura e profissionalização das artes. Myriam ressalta, a partir de suas próprias vivências e experiências, a importância das artes circenses para a formação não só de atores/atrizes, mas também para a formação de indivíduos inerentemente coletivos. Nessa inconstante construção da cidadania e da democracia, atualmente tão ameaçadas, este texto nos convida a sonhar outras possibilidades. Até porque é preciso aprender andar sobre a corda bamba para que tenhamos mais consciência dos nossos (des) equilíbrios. Este texto ilustra, resumidamente, a entrevista realizada por meio da plataforma Zoom, com a artista e professora Myriam Tavares. A iniciativa e realização da entrevista é da equipe do Grupo de Estudos Circenses (GEC/TU SIEX 204207), coordenado pela professora Maria Clara e composto pelas estagiárias Marina Barros e Carolina Matoso. A transcrição da entrevista e a elaboração textual a partir dela contaram com o trabalho dos colaboradores da equipe do Blog MISTURA.¹

Maria Clara: Primeiro, quero começar dizendo que é um prazer enorme ter você conosco neste diálogo, “Miroca”. Eu já falei um pouco de você para as meninas, ressaltando a sua importância não só para a vida do Teatro Universitário, mas como sua história perpassa toda a arte. Fui contando para elas um pouco do seu percurso e isso foi instigando a curiosidade delas. Nós temos aqui um ponto em comum: eu, a Marina e a Carol somos três apaixonadas pelo circo. Antes de começar a apresentar, quero dizer que cabe a mim a satisfação de ter reencontrado com você e de você ter topado falar um pouco sobre sua história. E eu queria que começasse com isso: quem é a Myriam? Apresente-se para a gente. Fala quem é a “Miroca”! Myriam Tavares: Eu acho que a “Miroca” é um Bombril 1001 utilidades - brinca. Na nossa formação, na nossa época, a gente tinha que fazer de tudo. Não existia verba, lei de incentivo, não tínhamos dinheiro; então, a gente tinha que colocar a mão na massa. Fazíamos: produção, divulgação, cenário, figurino e tudo que fosse necessário fazer conforme a demanda. Mas, antes, ressalto que é um prazer muito grande estar aqui conversando com vocês. Eu tenho um carinho muito especial com o Teatro Universitário. Quando eu entrei no TU, o quadro de professores estava completo. Com o passar dos anos, os professores foram aposentando e o governo não abria vaga/concurso para professores efetivos. Então, eu, Limoeiro e Linares ficamos por muitos anos segurando os problemas da escola, lutando para manter a qualidade do ensino e do curso. Nós éramos os únicos professores efetivos e conseguimos, mesmo com todas as dificuldades, deslanchar o curso para que ele se tornasse um curso técnico de formação do ator. Fico feliz em ver o TU como ele é hoje. Penso que hoje eu sou uma mulher muito feliz e realizada, porque, olhando para trás, 40 anos, eu acredito que vencer o preconceito de ser mulher-artista e ainda viver, em plena ditadura militar, com uma censura forte. Foram muitos desafios. Enquanto a gente fazia arte como hobby, era muito bonitinho; mas, quando você assumia seu ofício enquanto profissão, era um preconceito muito grande. Então, com todas essas dificuldades, veio essa força muito grande de realizar, tínhamos que acreditar, ser forte e seguir em frente, matando um leão por dia. Penso que, depois de ter rompido as barreiras e de ter conquistado o mercado de trabalho como bailarina, atriz, coreógrafa, diretora, animadora cultural e professora, foi muito gratificante.



Foto: Acervo pessoal Myriam Tavares

Maria Clara: De onde veio e por onde aconteceu o circo na sua vida? Você nos disse que foi animadora cultural, bailarina, coreógrafa. Existe alguma dessas profissões que veio primeiro? Como a arte entrou na sua vida? Como o circo começa a fazer parte dessa arte na sua vida? Myriam Tavares: Olha, quando criança, eu era muito moleca: gostava de ficar dependurada nas árvores e barras de ferro. Eu brincava na rua (com aquelas brincadeiras de carrinho de rolimã, patinete, patins, pernas de lata, acrobacias e árvores, pegador nos muros, bolinha de gude, finquinha na lama, barquinhos de papel na enxurrada e tamancas de pau). Então, era muita brincadeira, era muito jogo de rua e eu adorava o circo. Nós morávamos em Governador Valadares, o circo aparecia e eu estava lá. Quando viemos para Belo Horizonte, papai era um pé de valsa e ele dizia que eu tinha muito jeito para a dança. Aí, eu fui fazer balé na escola primária com 10 anos de idade. Depois disto, eu fui para o Palácio das Artes fazer balé clássico. Eu acho que tudo isso veio tudo junto, sabe? Tudo junto e misturado, uma coisa foi pedindo a outra. Eu fazia aula de clássico no Palácio das Artes e paralelamente eu fazia aulas de dança moderna e contemporânea na Escola de Dança Marilene Martins (Nena), depois a escola passou a ser chamada Escola de Dança Transforma. No Transforma, a nossa formação era dança, teatro, consciência corporal e ritmo. Eu tive uma formação muito boa, porque tudo que era diferente a Nena trazia para gente, então foi um privilégio ter tido essa formação. Eu fiz, também no Grupo Experimental Transforma, um trabalho com o Eid Ribeiro, que foi o ‘Terreno Baldio’. A direção teatral e o texto são do Eid, coreografia da Marilene Martins (Nena), da Angel Vianna e do grupo dos bailarinos. Foi uma criação coletiva. Neste trabalho, nós investigamos bastante a linguagem circense, o que me motivou muito a continuar pesquisando. Depois do ‘Terreno Baldio’, queria muito me aperfeiçoar na linguagem circense, porque, na dança, toda vez em que trabalhávamos os movimentos acrobáticos e arriscados de pular ou saltar, eu logo me candidatava para ser a primeira a fazer. Então, eu comecei a sentir que não queria só isso; eu queria me engajar mais, fazer mais, aprender mais sobre o circo. Porque... o circo é um mundo mágico, cheio de fantasias, encanto, sonho e mistério. Mágico, porque ele é lúdico, nos faz recordar que ainda existe, em cada adulto, um pouco daquela criança que já fomos, de querer brincar e superar obstáculos. Misterioso, porque você tem que se jogar no desconhecido para vencer o medo e trabalhar o seu equilíbrio físico, emocional, mental e espiritual. Tem que sair da sua zona de conforto para desequilibrar no seu aprendizado, tentando encontrar o seu eixo. Isso me motivou demais. A partir disso, comecei a pesquisar sobre o circo, momento em que pude perceber que não tinha muita literatura e nem material. Então, quando você me pergunta onde eu comecei, é engraçado... porque começou tudo junto. Na época, eu participava da APATEDEMG (Associação dos Profissionais dos Artistas e Técnicos de Diversão do Estado de Minas Gerais - atual SATED/MG). Eu era da área de dança quando eu comecei a “futricar” sobre o circo e vi que não tinha muita coisa sobre isso na associação; só tinha o pessoal da dança, do teatro e os técnicos em diversão. Aí eu falei: “Gente, cadê o circo?!” Por isso, comecei a procurar e investigar. Foi quando comecei a montar o espetáculo ‘IAM - O PALHAÇO’; queria fazer um espetáculo-solo, que teria a linguagem circense. E aí, eu procurei assistir aos espetáculos de circos mambembes pela periferia de Belo Horizonte – e vi que os equipamentos que eles usavam eram todos muito improvisados. Com olhos atentos à prática e às linguagens do circo, eu comecei a inventar também. Para fazer as claves, eu comecei a fazer com garrafas de boliche de brinquedo e deu certo. Eu treinava absolutamente tudo: rolo, arame, malabares (bolinha, clave, argola, lenço e chapéu). Eu confeccionei quase tudo. Com a montagem desse espetáculo circense, eu criei o trapézio janela, para poder desenvolver os movimentos lentos e acrobáticos. Não podia ser trapézio volante, porque tem um movimento muito rápido. Eu queria evoluir corporalmente e fazer os movimentos mais lentos. Então, criei o trapézio janela para poder fazer a coreografia que eu queria. Deu certo! O espetáculo foi muito bonito e abriu portas para mim. Todos os lugares que eu me inseria, eu aproveitava para introduzir a técnica circense. Com a minha formação de consciência corporal no Transforma, comecei a entender que cada equipamento demandava um tipo de equilíbrio. Isso me trazia uma consciência muito boa para o eixo, para o equilíbrio físico e emocional. Então, eu vi que a gente poderia trabalhar um controle muito grande da nossa ansiedade. Ora, para conseguir se equilibrar, a gente se desequilibrava totalmente. Então, eu vi que a gente trabalhava a flexibilidade, o raciocínio rápido, aspectos muito ricos para a formação do ator e do bailarino. Assim, comecei a aplicar essas técnicas na prática e no ofício. Foi uma coisa meio autodidata mesmo. As coisas foram surgindo na medida em que eu as praticava.


Espetáculo de Circo, Teatro e Dança " TERRENO BALDIO". Texto e Direção Teatral: Eid Ribeiro. Coreografia: Angel Vianna, Marilene Martins e Trans- Forma : Grupo Experimental de de Dança. Foto: Charles e arquivo pessoal de Myriam Tavares. Agosto de 1979 - bailarinas: Myriam Tavares e Lydia Del Picchia.
Espetáculo de Circo, Teatro e Dança " TERRENO BALDIO". Texto e Direção Teatral: Eid Ribeiro. Coreografia: Angel Vianna, Marilene Martins e Trans- Forma : Grupo Experimental de de Dança. Foto: Charles e arquivo pessoal de Myriam Tavares. Agosto de 1979 - Apresentador do Circo: Ator Fábio Correa.

Espectáculo Circo, Teatro e Dança: IAM- O PALHAÇO. Direção, Coreografia Texto, Coordenação , Cenário, Figurino e Trapézio Janela: Myriam Tavares. Poema e Produção : Adão Ventura. Foto: Charles e arquivo pessoal de Myriam Tavares. Outubro de 1982.


Marina Barros: É muito interessante te ouvir, porque eu fico tentando imaginar como era na época. Hoje em dia, na minha formação, quando eu quero estudar alguma coisa eu vou até algum lugar ou a alguma escola de referência. Acredito que esse trabalho de forma autodidata tenha sido um desafio. Você poderia comentar para a gente, Myriam, como era o cenário circense em BH nessa época?

Myriam Tavares: O cenário circense em BH, dentro da área da técnica, praticamente não existia. Foi no Festival de Inverno de Diamantina, acredito que mais ou menos no ano de 1980, que os alemães vieram dar uma oficina. Na ocasião, eles trabalharam a perna de pau, que foi uma coisa muito inovadora. No momento em que eu soube dessa oficina, ela já estava acontecendo e aí não dava mais para me inscrever. O que eu fiz? Fui correndo para o Festival de Inverno para ficar observando a oficina, porque já naquela época eu estava montando o espetáculo circense IAM - O PALHAÇO. Foi aí que eu comecei a conhecer algumas pessoas da área artística; o Grupo Galpão surgiu mais ou menos nessa mesma época com uma linguagem de teatro de rua; o Mauro Lúcio Xavier também, com o grupo Arco-íris (atual Grupo Teatro Kabana). Ainda nessa época, eu também trabalhava com o Grupo Oficcina Multimédia. Mas, ninguém ficava pensando “olha, isso é linguagem circense”, nós queríamos estudar, queríamos experimentar coisas novas. A Multimédia tinha muito essa ideia da música, do teatro, da performance, da dança como linguagem de expressão artística. Então, veja bem, eu trabalhava com Grupo Oficcina Multimédia e, paralelamente, também com o Grupo Experimental Transforma que era o grupo que pesquisava todas as formas de expressão artística. Naquela época, a gente não tinha internet para pesquisar. A maioria da literatura para pesquisar movimentos acrobáticos era na área de Educação Física, especificamente na ginástica olímpica e rítmica. Como mencionei anteriormente, quando eu estava montando o “Iam”, eu queria aprofundar mais essa linguagem acrobática. Desse modo, fui ao Minas Tênis Clube, conversei com o professor e comecei a fazer ginástica olímpica para aprender os movimentos acrobáticos, para ter mais resistência física, para trabalhar os braços no trapézio e na corda. Então, eu trabalhei um tempo com ginástica olímpica, aprendendo as técnicas acrobáticas. Além disso, eu também aprendi muito ensinando. Então, sobre a época, posso falar que foi de 1980 para cá que tudo começou.

Depois do “Iam”, em 1983, o Festival de Inverno da UFMG me convidou para dar uma oficina de dança. E eu dei um curso criativo diferente, porque eu introduzi uns movimentos acrobáticos no curso. Em 1985, eles me chamaram novamente para dar uma oficina de dança. Na oportunidade, eu sugeri a eles que a gente poderia dar uma oficina de circo para crianças (e trabalhar com criança é muito lúdico, porque elas não tem medo de arriscar né?). Na época, não tinha esse tipo de curso. Acredito que eu tenha sido a primeira a introduzir a disciplina de técnicas circenses no curso de formação de ator da Fundação Clóvis Salgado. Eu trabalhava também com os grupos profissionais de teatro e na Escola de Dança Corpo. Os alunos do Teatro Universitário da UFMG começaram a ver o meu trabalho e pediram para o TU me convidar. Foi quando eu fui dar aula de expressão corporal e dança no TU. Dentro da disciplina expressão corporal, eu tive uma abertura da escola para introduzir a técnica circense. Aí, eu levei meus equipamentos todos e comecei a introduzir a disciplina de técnica circense lá no Teatro Universitário.

A questão da técnica circense para a formação do ator é que o processo requer a persistência, a concentração, coordenação motora, agilidade, flexibilidade, equilíbrio físico, emocional, mental e espiritual, auto-organização, percepção, reflexo, dinâmica corporal e de grupo, compreensão rápida, disciplina e coragem. Significa também, satisfação e alegria naquilo que se está fazendo. Significa prazer. A minha intenção não era que os alunos fossem exímios profissionais das artes circenses e sim, passar por todo esse processo do aprendizado que é muito rico e, ao mesmo tempo, frustrante e irritante, pois o erro é constante até se chegar no domínio técnico. Quando você chega no domínio técnico e consegue equilibrar e fazer evoluções na perna de pau, nos malabarismos, no rolo, no arame, no monociclo e conseguiu superar as dificuldades, aí sim, vem a alegria, a satisfação, a confiança, a autoestima e a conquista da força de vontade que fica para toda a vida. Este é o presente que a técnica circense oferece: a maturidade e o domínio dos equipamentos circenses como recurso para o teatro. Interessante é que a resposta corporal era maior e mais rápida. Se fosse seguir somente pelo trabalho corporal, demoraria um tempo maior. E eu vi que, com a técnica circense, esse tempo era mais rápido e dinâmico, o que me motivou a procurar mais recursos nas técnicas circenses.


Maria Clara: É interessante trazer a perspectiva de que o circo traz essa agilidade para o corpo do ator. Gostaríamos de conversar um pouquinho sobre esse tempo do aprender. Precisa de dedicação? É uma coisa fácil? Como é essa preparação do corpo? Myriam Tavares: Isso é muito relativo, porque, para mim, por exemplo, o aprendizado foi muito tranquilo. Eu tinha um equilíbrio bom e, quando eu peguei a perna de pau, por exemplo, eu já saí andando, porque na dança eu trabalhei muito equilíbrio. Foram muitos anos de dança. Eu respirava dança, fazia todas as aulas da escola. Então, isso depende muito da pessoa: têm pessoas que têm o eixo bom, equilíbrio bom, podendo pegar rapidamente o movimento. No entanto, algumas pessoas não têm e isso é frustrante. Por exemplo, eu vi que, com a criança, o processo é muito mais rápido, porque ela se entrega mais ela fica fissurada em conseguir aprender e quer vencer o medo. Com criança, vira jogo, vira brincadeira. Com adultos, não é bem assim. O adulto coloca o medo, enfatiza que não sabe, que não quer, estremece, bloqueia. Então, isso é muito relativo e depende muito de cada um. Agora, dedicação tem que ter. Trabalhar equilíbrio, trabalhar o corpo e a resistência física precisa de muita disciplina, precisa de muita vontade de querer vencer todos os obstáculos. Para andar em um arame ou subir numa perna de pau, você precisa vencer o medo de altura. É muito complicado. O coração vem na boca, você tem que administrar a situação e ter raciocínio rápido, senão você vai para o chão.

Quando eu comecei a dar malabares para os alunos, tinha aluno que queria me matar. Eu brincava com eles assim: “Olha, vocês vão aprender os malabares, porque vocês precisam ter campo de visão, paciência, persistência, reflexo. Agora, não adianta querer mandar as bolinhas para cima de mim, porque eu não sou a culpada, muito menos as bolinhas. Vocês têm que refletir; vocês vão ter dificuldades. É necessário romper essa barreira; e ela é sua, não é de mais ninguém”. Se você não ensaiar, se você não se dedicar, você não vai ser um bom ator. Todas essas áreas das artes cênicas são práticas.


Apresentação final da Oficina Circo , Teatro e Dança do Festival de Inverno da UFMG, número das crianças no Trapézio Janela. Professores: Myriam Tavares, Mauro Lúcio Xavier, Nélida Prado e Leonardo Ladeira. Foto: Gilson Ferreira e arquivo pessoal de Myriam Tavares.
Apresentação final da Oficina Circo , Teatro e Dança do Festival de Inverno da UFMG, número das crianças no Trapézio Janela. Professores: Myriam Tavares, Mauro Lúcio Xavier, Nélida Prado e Leonardo Ladeira. Foto: Gilson Ferreira e arquivo pessoal de Myriam Tavares.

Carol: Quando você percebeu e começou a nomear seu trabalho como técnica circense? Myriam Tavares: Quando você trabalha com os equipamentos circenses, o circo já está sempre inserido. Com as crianças, na oficina de técnicas circenses, já tinha o nome “Oficina de Circo, Teatro e Dança”. Já no Teatro Universitário, quando eu entrei como professora, não existia uma grade curricular formal. Tinha História do Teatro, Literatura Dramática, Interpretação, Técnica Vocal, Técnica de Dança e Preparação Corporal. Acredito que eram essas as disciplinas básicas da época. Quando eu entrei no TU, dentro da disciplina de expressão corporal, eu comecei a trabalhar com elementos circenses - perna de pau, vários tipos de malabares, rolo, arame etc. Todos esses equipamentos eu já vinha desenvolvendo com as crianças e aí eu levei para o TU Em 1992, quando estruturamos o curso formal como curso técnico de formação de ator do Teatro Universitário. Foi nesse momento que formalmente a disciplina de técnicas circenses 1 e 2 (ofertadas no primeiro e no segundo semestre do curso) entrou na grade curricular do TU.² Maria Clara: Qual percurso você fez dentro da UFMG com a atividade circense? Pode ser artística, mas também como disciplina, como extensão? Qual percurso você passou pela UFMG mesmo antes de ser professora, levando a linguagem circense para dentro da universidade? Myriam Tavares: Antes de entrar para o TU, eu já tinha dado o curso de dança no Festival de Inverno e depois o de circo para crianças. Essa oficina de circo para crianças teve uma evolução muito grande dentro do Festival e foi muito bonito. A gente encerrava o festival com um espetáculo circense com as crianças. Depois do Festival de Inverno, tinha um mini festival de inverno, chamado “Jornada Cultural”. Então, a universidade levava as oficinas para a cidade do interior e dava apoio aos estudantes e aos professores, como se fosse uma reciclagem para o professor daquela região. Então, eu ia e desenvolvia, dentro da jornada, oficinas de circo e oficinas de animação cultural. Portanto, eu trabalhei com a Jornada Cultural, com o Festival de Inverno. No COLTEC, na área de educação artística eu desenvolvi a oficina de técnica circense. Dei muitos cursos de extensão de dança e de técnicas circenses, tanto no TU quanto em cidades do interior, para professores e alunos e, vários outros eventos que aconteciam na Praça de Serviços no campus da UFMG. Eram muitos os eventos dentro da Universidade que a gente participava, agora eu estou me lembrando desses, mas se eu começar a procurar aqui no meu currículo vou achar muita coisa que nem lembro mais. Maria Clara: Em sua trajetória circense, também como professora, quais os pontos que você gostaria de destacar? Quais os pontos você gostaria de trazer à tona? Myriam Tavares: Um evento muito bacana que eu criei e produzi juntamente com o Léo Ladeira e Vera Ribeiro foi a Palhaceata I, II e III – evento para comemorar o dia internacional do palhaço (1988, 1989 e 1990) que contou com a participação de artistas profissionais, grupos profissionais de teatro e dança, trupes circenses, professores e alunos do Teatro Universitário e Colégio Técnico da UFMG. Teve também a “invasão de pernas-de-pau”, uma performance colorida, alegre e contagiante, em que os atores, por meio de vários personagens em perna-de-pau, com pipas de balão e fitas coloridas interagiam e animavam o público. Fizemos várias intervenções em vários locais na cidade de Belo Horizonte e no interior de Minas Gerais. As que mais chamaram a atenção, por terem sido um produção muito grande (40 artistas na perna de pau), foram na inauguração do espaço cultural “Serraria Souza Pinto” – no Fórum das Américas, com o patrocínio da Telemig (29/04/1997), Hora extra na sexta – comemoração do Natal dos funcionários da Telemig na Serraria Souza Pinto (1997), abertura da “1ª Feira e Festival Nacional da aguardente de cana, caninha ou cachaça” na Serraria Souza Pinto (1998). Era legal, porque participavam alunos do Teatro Universitário, ex-alunos que já estavam atuando como profissionais no mercado de trabalho e atores de vários grupos profissionais de teatro. Então, eu considero muito, nessa minha trajetória, esses eventos que eu consegui realizar. No Festival de Inverno, foram 12 anos participando com as oficinas de dança para adultos e oficina de circo teatro e dança para crianças, os vários grupos profissionais de teatro que trabalhei com os quais trabalhei a linguagem circense e a dança. Foram 40 anos dedicados ao ensino, pesquisa e extensão de segunda a segunda, foi muito trabalho, mas foi muito rico e prazeroso todo esse processo. Valeu. E muito!



"Invasão de Pernas de Pau" na Serraria Souza Pinto" 1997. Foto: Gilson Ferreira e arquivo pessoal de Myriam Tavares
"Invasão de Pernas de Pau" na Serraria Souza Pinto" 1997. Foto: Gilson Ferreira e arquivo pessoal de Myriam Tavares

 

¹ Todo o material foi disponibilizado previamente para a artista entrevistada, que aprovou o texto aqui publicado

² Embora a Secretaria de ensino de 2º grau do Ministério da Educação tenha aprovado, em 19/10/1989 a grade curricular do TU, somente em 1992, após a reforma curricular (aprovada no CEPE/UFMG) que as disciplinas circenses passam a integrar a grade curricular como disciplinas obrigatórias.

 

Myriam Tavares Pereira é formada em Dança e Letras. Coordenou o Curso de Dança Infantil e ministrou aulas por 10 anos na Escola de Dança CORPO. Fez Preparação Corporal e coreografias para os espetáculos de vários Grupos Profissionais de Teatro. Criou, dirigiu, produziu e coreografou o Espetáculo Circense " IAM- O PALHAÇO " onde idealizou e desenvolveu o Trapézio Janela. Criou e produziu AS PALHACEATAS - I,II, e III ( Comemoração do dia Internacional do Palhaço) e as "INVASÕES DE PERNAS NAS PAU". Participou como professora por 12 anos no Festival de Inverno da UFMG com os cursos de DANÇA para adultos e das OFICINAS DE CIRCO, TEATRO E DANCA para crianças. Participou das Jornadas Culturais da UFMG e vários eventos da universidade . Atualmente é professora aposentada do Teatro Universitário da UFMG onde criou a disciplina de Técnica Circense I e II para o Curso de Formação de atores, ministrou aulas de Dança , Preparação e Consciência Corporal e foi pioneira em divulgar a linguagem circense dentro da UFMG e em Belo Horizonte. Ministrou aulas de Técnica Circense no Coltec da UFMG na área de Educação Artística.

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