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PROCESSOS ARTÍSTICOS, SAÚDE MENTAL E SUAS REVERBERAÇÕES

Por César Divino


Como é possível produzir arte estando dolorosamente adoecido?

Como é possível reverberar beleza e contemplação artística sendo alvo de transtornos afetivos, mentais ou até mesmo físicos?

Por quais motivos somos motivados e maravilhados por Basquiat, Goya, Frida, Machado de Assis, Clarice Lispector, dentre outros artistas que tocam nossa alma?

Há infinitas respostas para tal pergunta, principalmente toleráveis, importantes ou demasiadamente desnecessárias.


Foto: Ismael Soares


Não penso na ideia de estar em arte e ser alheio a adoecimentos.

Infinitas pessoas, com suas infinitas respostas, tentam ou acreditam numa resposta plausível, que deixará nossos corações livres dos desvios, fazendo com que nossa produção artística seja "impecável", sem defeitos, de qualidade.

Os desvios também são importantes, pois revelam a alma do artista e o reflexo do que expurgam, devolvendo ao mundo, como processo de "alívio" da dor.

É conflitante e aterrorizante pensar que transtornos distintos afetarão nosso processo artístico, nossa relação com a arte.


Teatro, dor, aflição, ansiedade, entusiasmo, medo.


Uma mistura de sensações que desabrocham da teoria à prática, do deixar-se sentir, mover e ser arte. Parte do processo, latente em quem produz, afetando corpo, physis, alma.

Cada um reflete e sente medo, torna-se um e é tomado por um caos total, impedindo completa atenção, disciplina e produtividade, inventabilidade.

O sofrimento pulsa externamente, falta vontade, coragem e desejo em arte.

Qualquer solução que tire dor e sofrimento acaba duplicando dores e sofrimentos.

Abandono, descaso, incapacidade de comunicar e dizer de si, do que afeta e destrói internamente.


Mas, mesmo em meio ao caos, produzimos.

Foto: Acervo pessoal
Foto: César Augusto



Infinitas possibilidades, jeitos e novas maneiras de ser, pensar e fazer arte.

A caminhada não é fácil, principalmente quando o desejo e a dor se fundem, impedindo a passagem da realidade, do presente.


Modificações acontecem a todo momento e, confesso, não é nada fácil lidar com elas.

No caminho, ajudas aparecem remediavelmente curativas ou não. Paliativas, motivadoras e alegremente fortes, ao ponto de retomarmos produções.

Mas, há os entraves, os indesejos, as desistências.

Desistência de si, do outro, da arte, sem arte.

Amigos, conselhos, fé de todas as formas possíveis, bebidas, vícios incuráveis.

Alguns se vão, muitos permanecem.




Foto: Acervo pessoal


As produções artísticas se tornam partes universais, multiplicadas em vários cantos, expostas coletivamente, cada um sendo tomado e tomando parte da obra e da pessoa responsável por sua autoria.

E assim tem sido.


Não é fácil sobreviver em arte, mas há quem prefira continuar, mesmo que o caminho seja estreito, mesmo que não seja duradouro, mesmo que não seja mais o caminho inicial.


Sigamos, pensando e vivendo arte, sendo ramificados e reverberando ramificações.






 

César Divino é um ator novalimense formado pelo Teatro Universitário da UFMG em 2017.

Apaixonado pela palavra, é náufrago-escritor no Blog "Memórias de um Afogado".


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